As vinícolas Salton, Aurora e Cooperativa Garibaldi deverão pagar ao todo R$ 7 milhões de indenização por danos morais individuais e por danos morais coletivos devido ao caso dos 207 trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão no último dia 22 de fevereiro, em Bento Gonçalves. O valor está estabelecido no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre as empresas e o Ministério Público do Trabalho (MPT) na quinta-feira (9). Em coletiva de imprensa na manha desta sexta-feira (10), procuradores do MPT explicaram que a primeira parcela, no valor de R$ 2 milhões, será paga pelas empresas em 15 dias. O montante será dividida entre as 207 vítimas, o que significa que cada trabalhador resgatado receberá R$ 9,6 mil. Nesta primeira parcela, a Aurora pagará R$ 916 mil, a Salton R$ 716 mil e a Garibaldi R$ 366 mil, divisão proporcional ao uso da mão de obra em condições degradantes.
Ao todo, a atuação do MPT já garantiu reparações em mais de R$ 8 milhões, tanto aos trabalhadores atingidos quanto à sociedade, considerando os R$ 7 milhões de indenização por danos morais individuais e por danos morais coletivos que serão pagos pelas vinícolas, além das verbas rescisórias de R$ 1,1 milhão já pagas pela empresa terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda. Os valores do dano moral coletivo serão revertido para entidades, fundos ou projetos visando a recomposição do dano.
O acordo entre o MPT e as vinícolas foi firmado após mais de oito horas de audiência telepresencial com os representantes legais das três empresas. No TAC, as três vinícolas assumiram 21 obrigações para aperfeiçoar o processo de tomada de serviços, com a fiscalização das condições de trabalho e direitos de trabalhadores próprios e terceirizados, e impedir que novos casos semelhantes se repitam no futuro. Outro objetivo expresso no documento é monitorar o cumprimento de direitos trabalhistas na cadeia produtiva. As obrigações pactuadas passam a valer imediatamente.
Segundo o MPT, a assinatura do TAC garante o cumprimento imediato de suas obrigações com a mesma força de uma sentença judicial, e de modo mais rápido. Na visão do órgão, o acordo estabelece um paradigma jurídico positivo no Rio Grande do Sul e no Brasil no sentido da responsabilidade de toda a cadeia produtiva em casos semelhantes. A apuração do MPT no caso prossegue no que diz respeito à responsabilização da empresa prestadora, a Fênix, que rejeitou a possibilidade de acordo.
O acordo
O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre o Ministério Público do Trabalho (MPT) e as três vinícolas foi elaborado levando em consideração a responsabilidade que o setor econômico tem de fiscalização e monitoramento de toda a cadeia de produção. Entre as obrigações, ficou estabelecido que as empresas devem zelar pela obediência de princípios éticos ao contratar trabalhadores diretamente ou de forma terceirizada; abster-se de participar ou praticar aliciamento; de manter ou admitir trabalhadores por meios contrários à legislação do trabalho e de utilizar os serviços de empresas de recrutamento inidôneas. As empresas também se responsabilizam por garantir e fiscalizar as áreas de alojamentos, vivência e fornecimento de alimentação.
Outras das disposições contemplam a obrigatoriedade de as empresas só firmarem contratos de terceirização com empresas com capacidade econômica compatível com a execução do serviço contratado; de fiscalizar as medidas de proteção à saúde e à segurança do trabalho adotadas pelas terceirizadas e também exigir e fiscalizar o regular registro em carteira de todos os trabalhadores contratados para prestação de serviços, bem como os pagamentos de salários e verbas rescisórias.
Também é papel das empresas no acordo promover, entre outras empresas do setor vinícola e entre associados de suas cooperativas, estratégias de conscientização e orientação, contemplando seminários sobre boas práticas e cumprimento de legislação sobre direitos trabalhistas e direitos humanos, inclusive abordando temas de segurança, saúde e medicina do trabalho e trabalho em condições análogas à de escravo.
Pelo acordo, as três empresas também deverão garantir o pagamento das indenizações individuais aos trabalhadores resgatados em caso de impossibilidade por parte da empresa contratante, de propriedade de Pedro Augusto Oliveira de Santana
Empresa terceirizada recusa acordo
A empresa contratante Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, após haver quitado R$ 1,1 milhão em verbas rescisórias acordadas em um TAC emergencial elaborado no momento do resgate, recusou-se, após duas audiências, a firmar termo de ajuste de conduta. O MPT agora está tomando medidas judiciais com relação à empresa – a primeira delas foi o pedido do bloqueio judicial de bens do proprietário Pedro Santana até o valor de R$ 3 milhões.
O juiz Silvionei do Carmo, titular da 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves, aceitou o bloqueio de bens de nove empresas e 10 pessoas envolvidas no caso. O magistrado acatou pedido liminar em ação civil pública ajuizada pelos procuradores do MPT. A liminar foi deferida na sexta-feira (3), em segredo de justiça. Nesta quinta-feira (9), após diligências iniciais, o magistrado retirou o sigilo do processo.
O bloqueio de bens foi determinado pelo juiz como limitado a R$ 3 milhões, recurso estimado para garantir o pagamento de indenizações por danos morais individuais, bem como das verbas rescisórias e demais direitos de trabalhadores que não estavam presentes no momento do resgate. Despacho publicado nesta quinta indica a existência de bloqueio de R$ 70 mil em contas bancárias dos réus. Já houve também a restrição de 43 veículos, cujos valores serão avaliados. O juízo ainda aguarda o resultado dos atos de restrição de imóveis em nome dos envolvidos.