As desigualdades salariais entre homens e mulheres ainda persistem no Brasil. Mesmo obtendo a maioria dos diplomas de curso superior no Brasil, a população feminina ainda ganha menos, ocupa menos cargos de chefia e passa mais tempo cuidando de pessoas ou de afazeres domésticos do que os homens. Esse é o quadro mostrado pelo estudo “Estatísticas de Gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil”, divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) na véspera do Dia Internacional da Mulher.
A pesquisa traz um conjunto de informações sobre as condições de vida das brasileiras com base em recomendações da ONU e agrupadas em cinco temas: estruturas econômicas e acesso a recursos; educação; saúde e serviços relacionados; vida pública e tomada de decisões; e direitos humanos de mulheres e crianças. A conclusão do órgão é que “o caminho a ser percorrido em direção à igualdade de gênero, ou seja, em um cenário onde homens e mulheres gozem dos mesmos direitos e oportunidades, ainda é longo”.
Entre a população com 25 anos ou mais, 16,9% das mulheres possuíam curso superior completo em 2016, contra 13,5% dos homens. Entretanto, mais qualificação não reflete em melhor posição no mercado de trabalho: o rendimento habitual médio mensal era de 1.764 reais para as mulheres e 2.306 reais para os profissionais do sexo masculino naquele ano. Elas também estão em desvantagem na tomada de decisões no trabalho: ocupavam apenas 37,8% das posições gerenciais. O tempo dedicado aos cuidados com filhos, idosos e com a casa também é bem discrepante: 18,1 horas semanais delas e 10,5 horas semanais deles.
A vantagem educacional das brasileiras pode ser explicada, em parte, por uma necessidade de se provar mais profissionalmente, já que as empresas têm resistência em contratá-las, reproduzindo a crença que mulheres em idade fértil ou mães custam mais e rendem menos que um homem. “Mas não é só isso, 40% das mulheres são chefes de família e têm buscado melhores oportunidades de colocação por esta via”, acredita Evelin Fomin, jornalista especialista em estudo de gênero, mídia e cultura e idealizadora do projeto SomosMuchas, uma plataforma de avaliação do ambiente de trabalho das empresas pelas mulheres.
É o caso da pedagoga Samanta Tobias, de 43 anos. Ela é a única da família de seis irmãos que fez faculdade. “Comecei o curso aos 22 anos e tive de parar no segundo ano, porque engravidei. Voltei somente quatro anos depois e me formei. Gosto de estudar, fiz duas graduações e quatro especializações, sempre com bolsa de estudos”, conta ela, que é mãe solteira e hoje se divide em dois empregos. Um de seus irmãos chegou a entrar em uma universidade, mas abandonou. “Eles tiveram filhos muito cedo, um deles com 16 anos. Estudar deixou de ser prioridade”, explica.
Ela sente que mesmo na área de educação, majoritariamente feminina, há mais diretores do sexo masculino, e que com o currículo que carrega poderia estar em cargos mais altos se fosse homem. “Eles não precisam ficar provando tanto, a figura masculina impõe mais respeito”, acredita.
“Algumas mudanças culturais do funcionamento estrutural que ocorre nos ambientes de trabalho, sobretudo os corporativos, têm grande dificuldade de absorver o ‘espírito do tempo’”, opina Fomin.
Isso também é percebido na representatividade política. Os números apontam que 10,5% dos assentos da Câmara dos Deputados são ocupados por mulheres, enquanto a média do mundo é 23,6%.
Cenário é pior para as negras e pardas
A publicação do IBGE afirma que “no Brasil, não é apenas o sexo tem impacto significativo nas estatísticas, mas também cor ou raça, ser portador de deficiência, morar em áreas urbanas ou rurais reforçam desigualdades”. Alguns números exemplificam esse cenário: a taxa de fecundidade adolescente (de 15 a 19 anos) quase dobra na região Norte (85,1%) em relação ao Sudeste (45,4%). E ainda entre os índices de escolaridade, 23,5% das brancas têm formação superior e somente 10,4% das negras e pardas. VEJA.com