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Golpes em nome de grandes hospitais se espalham

Eram 8h30 da manhã quando a jornalista Selma Salgado (nome fictício), 33 anos, recebeu uma ligação do suposto médico infectologista Marcelo Castro, informando que sua tia, que estava sendo atendida na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital da Bahia, precisava realizar exames de urgência em um laboratório fora do hospital.

Segundo o médico, a bactéria HVE tinha tomado 25% do corpo da paciente e que, se chegasse aos 70%, ela morreria. O profissional informou que eram necessários quatro exames, que custariam R$ 4.900 – quantia que deveria ser depositada em uma conta do Banco do Brasil. Tudo não passava de um golpe. A bactéria sequer existe.

O telefonema, feito fora do horário de visita (liberada no hospital somente às 11h e às 16h), é uma estratégia utilizada para que a vítima não busque informações na unidade de saúde. “Ele sabia o que minha tia tinha, quais exames ela tinha feito, o resultado deles e que o convênio era o Planserv. A pessoa deu confiança, passou informações médicas sigilosas. Jamais achei que fosse um golpe”, contou Selma.

Cada vez mais frequente nos hospitais particulares de todo o país, a fraude do falso médico tem feito vítimas na Bahia desde o início do ano passado, conforme informou a Associação de Hospitais e Serviços de Saúde do Estado da Bahia (Ahseb). A associação emitiu uma nota de alerta em maio do ano passado.

Por causa desse tipo de crime, os hospitais Português, Aliança, São Rafael, Cárdio Pulmonar, da Bahia, Emec (em Feira de Santana), entre outros, passaram a emitir um comunicado escrito, salientando que não faz contato telefônico com pacientes ou responsáveis solicitando pagamentos por procedimentos hospitalares. “Você fica ali tensa por causa do risco de saúde. Assinei um termo, mas não li, apenas assinei e depois soube disso da pior forma possível”, lamentou Selma.

Nos sites desses hospitais, anúncios pop-up alertam que todo depósito deve ser feito no caixa da unidade. Após saber do golpe, a jornalista ainda retornou para o número com DDD 71 do criminoso que havia ligado para ela. “Perguntamos por que ele tinha feito aquilo e ele disse que estava precisando de dinheiro e que caímos direitinho”, recordou ela. Depois de dizer que iria correr atrás para denunciar a fraude, o bandido respondeu: “Você nunca vai me encontrar”.

Hospital Emec, de Feira de Santana, alerta pacientes em comunicado

Vazamento

A assessoria de imprensa do Hospital da Bahia confirmou o vazamento de dados de pacientes, mas não soube informar como os criminosos têm acesso aos prontuários. Apesar da situação ocorrida com a familiar da jornalista, o hospital não abriu sindicância para investigar o caso e ressaltou que os funcionários que têm acesso aos dados são de confiança da instituição. A família registrou um boletim de ocorrência e pretende levar o caso à Justiça, denunciando o hospital pela divulgação indevida de informações sigilosas.

Em nota, o Banco do Brasil informou que faz análise detalhada de ocorrências do tipo e que elas são tratadas como crimes conhecidos por “engenharia social”, quando um indivíduo age de má-fé contra outro. O banco orienta que as vítimas verifiquem as medidas legais para conseguir de volta o valor transferido.

Mais casos
No mesmo dia, outra família com parente internado no mesmo hospital também foi vítima do golpe. A avó do piloto Sérgio Machado (também nome fictício), 28 anos, estava hospitalizada há uma semana na unidade. Quem atendeu o telefone foi uma tia dele, filha da paciente. Por volta das 14h30, também fora do horário de visita, o criminoso ligou se identificando com o mesmo nome do falso médico infectologista Marcelo Castro.

O valor pedido foi R$ 2.900 e, dessa vez, o golpista disse que o dinheiro seria ressarcido pelo plano de saúde. “Minha tia estava no interior, ela acabou acreditando e passou mal porque achou que o caso era irreversível”, relatou Sérgio. Os familiares registraram o golpe na 16ª Delegacia (Pituba) e também pretendem entrar com ação contra o hospital.

Outro caso foi registrado na 28ª Delegacia (Nordeste de Amaralina), no dia 31 de janeiro deste ano. A vítima era paciente do Hospital Aliança. Também por meio de ligação, um suposto médico chamado Rafael Menezes solicitou o pagamento de R$ 2 mil para exames laboratoriais. A conta em que o valor foi depositado era do estado de Goiás. Em nota, o Hospital Aliança confirmou que criminosos estão extorquindo familiares de pacientes e, sem detalhar, relatou ainda outras ocorrências no início deste mês.

O Hospital Aliança afirma que, além de ter acionado a polícia, adotou medidas preventivas para alertar as famílias. Uma delas foi ampliar o alerta sobre o golpe através de divulgação nas TVs corporativas das salas de espera. Além disso, também colocaram cartazes nos apartamentos e, no ato de internação, os assistentes entregam um comunicado sobre o assunto.

“Consideramos importante que isso seja amplamente divulgado na tentativa de coibir a ação dessa prática criminosa, uma vez que o ambiente hospitalar é um local de fragilidade emocional para as famílias de pacientes internados”, disse o hospital em nota.

Esses três casos relatados já estão sendo investigados pelas respectivas delegacias que receberam os registros. A Ahseb não tem estatística sobre o número de crimes contra as instituições. Apesar de ter sido procurada por alguns hospitais, a associação não levou o caso à polícia. Segundo o órgão, as unidades de saúde acionaram as autoridades de forma individual.

Após a frequência da situação, o Hospital Português passou a orientar os pacientes que se sintam lesados que façam o registro da queixa aos órgãos competentes. Segundo informou a assessoria, a instituição reforçou a comunicação com o público através das redes sociais e canais internos. Em um comunicado, a unidade alerta aos próprios funcionários que as informações referentes aos pacientes devem ser passadas pelo profissional responsável, sempre pessoalmente.

Polícia orienta registrar os casos e desconfiar de ligações
O delegado Charles Leão, do Departamento de Repressão a Crimes de Estelionato e Outras Fraudes (Dreof), diz que esse tipo de golpe está se disseminando pelo Brasil. Segundo ele, os golpistas podem realizar a fraude de qualquer lugar do país, inclusive utilizando contas de “laranjas” – quando alguém empresta seus dados para intermediar transações financeiras ilegais.

“O que eu recomendo é que as vítimas registrem a queixa para que possamos fazer a investigação. Só assim saberemos como essas informações estão sendo vazadas”, explicou o delegado. A delegada Maria Selma, titular da 16ª Delegacia (Pituba), confirmou ao CORREIO que investiga um caso de golpe contra um familiar de paciente do Hospital da Bahia. Ela, no entanto, não forneceu informações sobre o caso para não comprometer o andamento das investigações. *Informações extraídas do Atarde.