Em dezembro de 2019, período onde os nossos passos futuros não estavam sujeitos a um cenário nebuloso e complexo, o Tribunal Superior Eleitoral estabeleceu todas as datas eleitorais que seriam observadas em 2020, e o fez com base nos preceitos do artigo 14, e seguintes, da Constituição Federal, além das determinações da Lei 9.504/97.
Apesar disso, como todos sabemos, 2020 está sendo tudo, menos um ano normal, e, por essa razão, a rotina eleitoral a qual estamos todos acostumados – corpo-a-corpo eleitoral, concentração de pessoas em passeatas, inaugurações de comitês eleitorais, festas nas convenções partidárias e até filas nas sessões de votações – torna-se inaplicável no momento.
Diante disso, inúmeras foram as discussões e as hipóteses trazidas pelos congressistas, pelos estudiosos do Direito Eleitoral e até pelos próprios ministros do TSE.
As principais foram: – unificação dos mandatos municipais, estaduais e federais e a realização de um único pleito em 2022. Esta foi defendida mais contundentemente pelos senadores em início do mandato, razão pela qual aparentemente não ganhou corpo; – a segunda hipótese aventada foi a mais radical, e só aconteceria no caso de não ser alcançada uma solução por parte dos congressistas, onde os mandatos atuais seriam encerrados e, em virtude da sua vacância, os juízes das comarcas assumiriam temporariamente o exercício do cargo máximo municipal ( em simetria ao que dispõe a Constituição Federal em relação ao Presidente do Supremo Tribunal Federal assumir a Presidência da República); – a terceira, em uma evidente tentativa de manutenção do calendário atual, foi a instituição do voto à distância, através de aplicativo desenvolvido e controlado pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Mais do que a superação de eventuais falhas técnicas, a aprovação das propostas encontrou um entrave ainda maior: a superação das formalidades para a alteração da Constituição Federal (dois turnos de votação perante os 513 deputados federais, e outros dois turnos perante os 81 senadores, além dos “pitacos” dos principais interessados: os prefeitos e os vereadores) em um momento que os ânimos estão aflorados e qualquer discussão que não seja relacionada ao problema de saúde pública que vivemos será malvista.
E quando as circunstâncias rumavam para a indefinição, para o radicalismo e até expunham a risco o sistema democrático, os líderes do Congresso Nacional, capitaneados pelos Presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, exercendo senso de representatividade, chegarem a uma solução intermediária, cuja materialização ocorre através da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional número 18, de 2020.
A referida proposta visa alterar o artigo 115, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, “atrasando” as eleições municipais em 45 dias, fazendo com o primeiro turno aconteça em 15.11.2020 e, nos municípios com mais de 200.000 eleitores, acaso necessário, o segundo turno ocorra em 29.11.2020.
Sobre a emenda constitucional aprovada, alguns aspectos merecem destaque, especialmente a estratégia de alteração dos atos constitucionais transitórios, e não o texto constitucional, o que evidencia que a regra de 2020 não valerá para as próximas eleições nacionais, estaduais ou municipais, ou seja, nos próximos pleitos o primeiro turno será realizado no primeiro domingo de outubro e o segundo turno no último domingo do mesmo mês.
Outro ponto de destaque diz respeito à manutenção de parcela das datas e prazos anteriormente estabelecidos pelo TSE através da Resolução 23.606, uma vez que, alguns prazos já foram superados, enquanto outros ainda estão por vencer.
A título de exemplo já venceram os seguintes prazos: – 05 de março até 03 de abril, para o início da troca de partido pelos candidatos sem que haja risco ao mandato atual (infidelidade partidária); – 04 de abril (06 meses antes do pleito), é a data final para que os candidatos tenham domicílio eleitoral no município onde pretendam disputar as eleições, também é a data final para que estejam filiados aos partidos onde terão legenda para a disputa; – 07 de abril é a data à partir da qual os pretensos candidatos devem estar desincompatibilizados dos cargos onde sejam ordenadores de despesas ou que possam aumentar os subsídios dos servidores; 15 de maio é o início do período onde os pré-candidatos podem começar a arrecadação de fundos para a campanha; – 30 de junho é o último dia onde candidatos podem apresentar programas nos canais de comunicação de massa.
Em complementação, a resolução estabelecia outros, que ainda venceriam: – 04 de julho é a data à partir da qual os candidatos que sejam detentores de mandato eletivo não podem nomear ou exonerar funcionários sem as devidas justificativas, realizar despesas, exceto à pré-existentes, participar de atos de publicidade institucional ou equivalente e também inaugurações públicas; – 20 de julho até 05 de agosto é o prazo para a realização das convenções para a escolha dos candidatos e formalização das coligações; – 15 de agosto é o prazo final para o registro das candidaturas; – 16 de agosto é a data à partir da qual tem início a campanha eleitoral.
Ocorre que, conforme dito, o atraso em 45 dias da data do pleito, fez com que algumas datas fossem alteradas pela própria PEC, enquanto outras ainda dependem de nova regulamentação através de Resolução do TSE.
E apesar de algumas arestas, e das incertezas do momento, a promulgação da PEC18/20 nos deixa a sensação que o diálogo e os pilares democráticos sempre prevalecerão.
*Acácio Miranda da Silva Filho é advogado, professor de Direito Eleitoral, Penal e Constitucional.