Quando a vereadora Marielle Franco, assassinada a tiros no Rio de Janeiro na noite desta quarta-feira, tomou posse em janeiro de 2017, a mãe dela confidenciou ao deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ) que tinha medo do que poderia acontecer com a filha.
“Ela me disse que Marielle era muito ‘briguenta'”, contou Alencar à BBC. Naquele dia, o deputado tentou tranquilizar a mãe da colega de partido, que havia sido a quinta mais votada na eleição para a Câmara do Rio. “Disse que, por causa do mandato parlamentar, estaria mais protegida. Infelizmente, não foi o que aconteceu”, lamentou Alencar à BBC Brasil na manhã desta quinta-feira.
Marielle Franco era muito corajosa, diz o deputado. “Ela incomodava pequenas e grandes máfias”, acrescentou, sem especificar quais. Em 15 meses na Câmara Municipal, ela apresentou 16 projetos de lei. Dois deles foram aprovados como leis concretas: um sobre a regulação de mototáxis, importante meio de transporte em favelas, e outro sobre contratos da prefeitura com organizações sociais de saúde, alvos frequentes de investigações sobre corrupção.
No final de fevereiro deste ano, se tornou relatora de uma comissão de vereadores que acompanha o trabalho de militares na intervenção federal na área de segurança do Rio. Ela nasceu e foi criada no Complexo da Maré, um dos maiores conglomerados de favelas do Rio.
No Twitter, ela criticava a violência policial. “O que está acontecendo agora em Acari é um absurdo! E acontece desde sempre! O 41° batalhão da PM é conhecido como Batalhão da morte. CHEGA de esculachar a população! CHEGA de matarem nossos jovens!”, postou em 10 de março.
“Mais um homicídio de um jovem que pode estar entrando para a conta da PM. Matheus Melo estava saindo da igreja. Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?”, escreveu três dias depois.
Pouco antes do crime, Marielle transmitiu no Facebook sua participação no evento “Jovens Negras Movendo Estruturas”, organizado por ela na Casa das Pretas, no bairro da Lapa, no centro do Rio. ‘Ato de quem sabe atirar’
“Ela não estava sob ameaça, mas incomodava muito policiais truculentos e milicianos. Todos os indícios são de execução, ato bárbaro de quem sabe atirar”, afirmou Chico Alencar à BBC Brasil.
Segundo as primeiras informações da polícia, a vereadora saia de um debate no centro do Rio na noite desta quarta quando um carro emparelhou o veículo onde ela, a assessora e o motorista estavam.
Dispararam pelo menos nove vezes. Marielle foi atingida com pelo menos quatro tiros na cabeça.
Os criminosos fugiram sem levar nada. Além da vereadora, o motorista do veículo, Anderson Pedro Gomes, também foi baleado e morreu. A assessora de Marielle, que foi atingida por estilhaços, teve ferimentos leves.
Segundo as primeiras informações, a vereadora estava no banco de trás do carro, no lado do carona. A polícia, que já ouviu duas testemunhas e coletou imagens de câmeras de segurança nas proximidades do local do assassinato, trabalha com a hipótese de os criminosos terem acompanhado o carro. O PSOL quer que a Polícia Federal acompanhe a apuração do crime, que está sendo conduzida pela Polícia Civil. Chico Alencar diz que no Brasil 90% dos homicídios ficam sem solução, mas que, se depender de seu partido, isso não vai acontecer com o caso de Marielle.
Em nota oficial, o Palácio do Planalto afirmou que acompanhará toda a apuração e que “o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, falou com o interventor federal no Estado, general Walter Braga Netto, e colocou a Polícia Federal à disposição para auxiliar em toda investigação”.
Já a Secretaria de Segurança Pública do Estado informou que “determinou à Divisão de Homicídios ampla investigação sobre os assassinatos da vereadora Marielle Franco e de Anderson Pedro Gomes (motorista da vereadora), além da tentativa de homicídio da assessora que a acompanhava”.