O ministério Público Eleitoral através de representação movida contra a prefeita de Itiruçu Lorenna Di Gregório e o vice-prefeito Júnior Petrúquio, além do vereador Ezequiel Borges, em razão de suposta prática de distribuição gratuita de bens em ano eleitoral, condutas estas vedadas pelo art. 73, §10, da Lei nº 9.504/97, bem como que atenta contra o art. 73, IV, da Lei nº 9.504/97 por parte do representado EZEQUIEL DO NASCIMENTO BORGES. A ação figura o crime no uso das estruturas da máquina pública para promoção pessoal dos agentes políticos. Para proceder com a sentença de condenação e multas aos envolvidos, o MPE identificou que a distribuição ocorreu antes do Decreto Municipal de Calamidade em decorrência da Pandemia do novo coronavírus, o que de fato ocorreu, pois foi suspendida a distribuição logo após o Ministério Público notificar o município através de portaria.
As condenações impuseram multas nos valores de: de 40.000 (quarenta mil) para o vereador Ezequiel Borges; para a prefeita Lorenna o valor da multa é de R$ 37.243,50 (trinta e sete mil, duzentos e quarenta e três reais e cinquenta centavos); e para o vice-prefeito Júnior Petrúquio o valor de R$ 31.923,00,00 (trinta e um mil, novecentos e vinte e três reais).
De acordo com informações obtidas pelo Itiruçu Online, todos os envolvidos recorreram da decisão de condenação na sentença. O caso segue aguardando novo julgamento de recursos.
Abaixo você terá acesso ao teor integro da Sentença, assinada pelo Juiz Eleitoral, Dr. PAULO HENRIQUE ESPERON LORENA, no último dia 24/06; Segue:
Na representação o Ministério Público Eleitoral constou que a ação foi instruída com documentos extraídos das redes sociais Instagram e WhatsApp e do sítio eletrônico onde fazia-se Market das ações, relatando a prática pessoal de condutas vedadas dos representados distribuindo sopa, inclusive com a utilização da estrutura do serviço social do município e do representado EZEQUIEL DO NASCIMENTO BORGES e se utilizando das referidas ações como promoção em favor de candidato, partido político ou coligação, pugnando, ao final, pela aplicação da sanção de pagamento de multa prevista no artigo 73, §4º, da Lei nº 9.504/97 e pela retirada, por parte do representado EZEQUIEL DO NASCIMENTO BORGES, de postagem específica da rede social Instagram. Foi determinada a notificação dos representados para apresentação de defesa.
Sobreveio aos autos a defesa dos representados de forma tempestiva (ID 1647042), na qual, em síntese, sustentaram que a distribuição dos listados EPI´s advieram de recursos pessoais dos próprios representados, que por falta de apresentação de data específica da distribuição da sopa por parte do Ministério Público Eleitoral restou prejudicada a contraprova do fato narrado e que os recursos para a produção da sopa foram doados por comerciantes locais, assim como que o município se encontra em estado de calamidade desde 20 de março de 2020 em razão de decreto legislativo expedido pelo Congresso Nacional. Oportunizada a manifestação ao Ministério Público Eleitoral acerca da defesa dos representados, o Órgão do Parquet Eleitoral sustentou que o termo de doação (ID 1647048) demonstra a incorporação dos bens doados ao patrimônio municipal, passando a constituírem recursos públicos e, por conseguinte, a caracterizar distribuição gratuita de bens na forma proscrita pelo art. 73, § 10º, da Lei de Eleições. Esse é o relatório, passa-se à fundamentação e decisão.
A Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97), no art. 73, estabelece algumas condutas vedadas objetivando garantir a igualdade de oportunidade entre candidatos nos pleitos eleitorais, buscando o elenco de proibições minimizar a interferência do gestor público na decisão dos eleitores, notadamente das pessoas que exercem atividades na administração pública, ou seja, os agentes públicos. Os representados, ao tempo da prática do primeiro evento fático a ser apurado, isto é, distribuição de máscaras, luvas e álcool em gel em 21 de março de 2020, eram agentes públicos, pois exercem os cargos políticos de vice-prefeito, prefeita e vereador, todos no município de Itiruçu/BA. De acordo com o §1º do art. 73 da Lei n. 9.504/97:
Reputa-se agente público, para os efeitos deste artigo, quem exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta ou fundacional. É imputado aos representados a violação do art. 73, §10º, da Lei nº 9.504/97, que possui a seguinte redação:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: […] § 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.
A norma proibitiva em análise é objetiva, proibindo ao agente público, em ano de eleição, distribuir gratuitamente qualquer tipo de bem, serviço ou benefício, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. In casu, o ano é 2020, no qual se realizarão eleições municipais, e comprovadamente nos autos, ocorreu a distribuição de máscaras, luvas e álcool em gel de forma gratuita por parte dos representados.
Embora os representados EZEQUIEL DO NASCIMENTO BORGES e LORENNA MOURA DI GREGÓRIO aleguem que os bens doados – máscaras, luvas e álcool em gel não pertenciam à Administração Pública do município de Itiruçu/BA, pois originários de seus patrimônios particulares, o §10, do art. 73 da Lei nº 9.504/97 não afirma que os bens distribuídos gratuitamente devem integrar o patrimônio da Administração Pública, a vedação aduz que a doação não pode partir da Administração Pública, essa que em sentido subjetivo, orgânico ou formal, nos dizeres de Maria Sylvia Zanella Di Pietro[1], “designa os entes que exercem a atividade administrativa, compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte a atividade estatal: a função administrativa” (PIETRO, 2015, p. 83, grifos nossos).
No que tange ao estado de calamidade pública, em 21 de março de 2020, ainda não vigorava no município de Itiruçu/BA, não podendo prosperar a alegação de que a decretação de estado de Num. 1818974 – Pág. 2 calamidade pela União tem o condão de englobar os municípios, visto que isso configuraria nítida violação à separação de poderes, cláusula pétrea (art. 60, §4, da CRFB/88), sendo que o estado de calamidade pública é estabelecido por decreto de cada ente da Federação.
Desse modo, diante da existência de calamidade pública em Itiruçu/BA somente a partir do Decreto nº 28, de 01 de abril de 2020, da Prefeitura Municipal de Itiruçu e de regulamentação normativa acerca da prestação de auxílio às famílias afetadas pela Pandemia de COVID-19 através do Decreto nº 33, de 04 de abril de 2020, da Prefeitura Municipal de Itiruçu, o qual permite em seu art. 1º, inc. III, a distribuição de “itens de asseio, prevenção e descontaminação, abrangendo álcool em gel, máscaras e luvas e outros itens similares”[2] não restando preenchida, objetivamente, a exceção prevista no §10 do art. 73 da Lei nª 9.504/97, dado que aquilo que não está permitido é proibido ao agente público, consoante o princípio da legalidade previsto no Caput do art. 37 da CRFB/88.
Idêntico fundamento relativo ao estado de calamidade pública alcança a segunda situação fática narrada pelo representante, isto é, a distribuição de sopas pelos representados EZEQUIEL DO NASCIMENTO BORGES, LORENNA MOURA DI GREGÓRIO e GILMAR MACHADO DE SANTANA JÚNIOR, com a ressalva que a normatização da conduta está no inc. II, art. 1º, do Decreto nº 33, de 04 de abril de 2020, da Prefeitura Municipal de Itiruçu[3]. Assim sendo, infere-se também se tratar de violação ao art. 73, §10, da Lei nº 9.504/97, além de ter ocorrido a distribuição gratuita por agentes públicos nas condições acima expostas, adota-se o exposto pelo representante na manifestação ID 1694179, haja vista que o contrato de doação no teor do art. 538 do Código Civil de 2002 é aquele em que “uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra” (grifos nossos). Isto posto, indubitavelmente houve incorporação dos bens doados ao patrimônio do município de Itiruçu/BA.
No que diz respeito à não delimitação pelo representante da data em que aconteceu a distribuição de sopas pelos representados, restou esclarecido no termo de doação 01/2020 (ID 1647048), cláusula segunda, item 2.1, que a ação social denominada ‘Sopão Comunitário’ teve por datas de realização 26/03/2020, 31/03/2020 e 02/04/2020, todas essas datas anteriores à normatização do Decreto nº 33, de 04 de abril de 2020, da Prefeitura Municipal de Itiruçu e o documento retrocitado foi juntado aos autos pela defesa e foi incorporado ao processo em conformidade com o princípio da aquisição processual (art. 371 do CPC/15[4]). Por fim, resta analisar a questão do uso promocional da distribuição gratuita de bens, diante da divulgação das ações na rede social Instagram, por parte do representado EZEQUIEL DO NASCIMENTO BORGES. O art. 73, inc. IV, da Lei nº 9.504/97 dispõe: