A alta temperatura de Jequié dos últimos dias não vem do clima escaldante, conhecido de moradores e visitantes da cidade. A fervura vem dos últimos acontecimentos políticos que afastaram a então prefeita Tânia Britto e alçaram à chefia do executivo o vice-prefeito já rompido, Sérgio da Gameleira (PSB). Em entrevista ao Bahia Notícias, o agora gestor tece críticas duras à prefeita impedida e disse que o cenário que encontrou é o mais caótico possível, “terra arrasada”, como declarou. “A população de Jequié vai pagar um preço muito alto por conta da irresponsabilidade que esse pessoal praticou aqui nesses três anos e quatro meses de gestão”, condenou. Leia abaixo a entrevista na íntegra.
A então prefeita Tânia Britto foi afastada do cargo por nova decisão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Ela chegou até a levar o caso para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas a Corte negou, o que fez o senhor assumir o posto. No entanto, a Justiça ainda pode trazer ela de volta. Essa instabilidade política prejudica a cidade?
Atrapalha. Porque esse momento de instabilidade política e jurídica termina complicando o dia a dia da administração. Gera dificuldade para montar equipe, para negociar com os nossos fornecedores. Aqui, tinha terceirizado com até seis meses de salário atrasado. Na sexta-feira (13), nós pagamos uma parte e, até esta terça-feira (17), nós vamos quitar a outra parcela da dívida. Também tivemos atraso no pagamento de servidores contratados pelo Reda, de estagiários e de cargos de confiança. A gente só não acertou o pagamento dos cargos comissionados porque não há dinheiro em caixa.
Os débitos param por aí?
Não. Descobrimos valores astronômicos de débitos com locação de veículos. Nessa gestão, duas empresas prestavam o serviço: uma atendia a área de saúde e a outra servia para a gestão toda. Chegamos a diagnosticar 49 veículos em uma secretaria, só que apenas 19 prestavam serviço. Além disso, temos mais de R$ 6 milhões de débito com a Coelba, mais de R$ 2 milhões de despesa com a Embasa, inclusive o prédio da prefeitura está com a água cortada desde a última sexta (13).
Como é que o senhor definiria a situação da prefeitura logo que assumiu?
Terra arrasada. Um caos. Cenário de guerra. A população de Jequié vai pagar um preço muito alto por conta da irresponsabilidade que esse pessoal praticou aqui nesses três anos e quatro meses de gestão. Nós vamos contratar uma empresa de auditoria para auditar todos os débitos, porque eles utilizam do expediente de pressionar as pessoas. Desde o dia que nós assumimos (dia 6 de maio), muitos donos de carros locados não vieram trabalhar.
Se esse é o cenário, quais as primeiras medidas que o senhor tomou para arrumar a casa? Quais foram as prioridades?
Primeiro, nós detectamos vários funcionários fantasmas. Só na Secretaria de Governo e na Secretaria de Administração – que são pequenas – encontramos 25 funcionários de serviços gerais, sendo que apenas dois compareciam e trabalhavam desde o início da gestão. Uma das primeiras medidas nossas foi exonerar todos os cargos de confiança, exceto apenas os cargos de saúde de educação por entender que são importantes para a população. Vamos reduzir drasticamente a contratação, locação e sublocação de veículos. Vamos fazer cortes em terceirizados. Já tivemos reunião com a Secretaria da Fazenda e o setor de tributos para alavancar a nossa receita. Aqui esta questão é muito lógica. É aumentar a receita e cortar ao máximo a despesa. Caso contrário, é situação pré-falimentar. Além do que, nós encontramos um rombo na previdência municipal da ordem de R$ 70 milhões a R$ 80 milhões. É outra prefeitura em termos de gastos. A gente não vai se precipitar nesse caso, mas vamos auditar para saber onde ocorreram esses desvios.
Há condições de negociar essas dívidas?
Olha, não tem condição de pagar tudo. Nós vamos convocar os fornecedores e pagar o que realmente devemos. Quando eu assumi não podia abastecer um litro de combustível. A dívida era de mais de R$ 600 mil. Se não tiver nenhuma notícia positiva, infelizmente vamos ficar impossibilitado de manter a frota própria do município que, diga-se de passagem, está sucateada. Tem mais de um ano e meio que a prefeitura não tem contrato para manutenção de sua frota.
Pelo fato de o afastamento da prefeita ainda não ser definitivo, o senhor tem receio de que ela volte e possa governar a cidade, mudando alguma medida tomada agora?
No início da próxima semana, nós vamos mensurar a opinião do povo sobre as mudanças propostas pelo novo governo. Vai ser uma pesquisa para mostrar, até para o Tribunal de Justiça da Bahia e outras instâncias, a realidade que a gente encontrou.
No plano estadual, o partido da prefeita Tânia Brito (PP) é aliado do governo Rui Costa. Essa relação pode prejudicar a gestão do senhor em Jequié?
Acho que não. O governador Rui Costa esteve aqui na última sexta (13) e nós temos uma relação muito boa. Além disso, o PSB é da base do governo, tem os nossos deputados que estão sempre na defesa do governo Rui. Tem o nosso deputado federal Bebeto Galvão, tem a nossa senadora Lídice da Mata. Então, acho que é uma relação de parceria.
E no plano federal, o senhor esteve em Brasília recentemente. Conversou com senadores, com o deputado Antônio Brito, enfim, com parlamentares. O que ficou estabelecido nesse encontro?
Embora eles já conheçam a realidade, eu fui levar oficialmente essa demanda do momento de dificuldade em que vivemos. Ao mesmo tempo, pedi também o apoio incondicional deles, mas não ao meu governo ou ao governo da prefeitura, mas para Jequié e cidades vizinhas que precisam de mais atenção.
A educação acabou se tornando o grande “calcanhar de Aquiles” de Jequié. Por conta de irregularidades no setor, a Justiça afastou a prefeita Tânia Brito. Atualmente, como tem sido a realidade da educação na cidade e o que o senhor pretende fazer para solucionar os problemas da área?
A situação da educação em Jequié é pior de tudo que lhe falei agora. É uma cidade que perdeu quase oito mil alunos nos últimos três anos e quatro meses da gestão Tânia. Então, isso traz para o município um ônus porque diminui o repasse do Fundeb [verba federal para educação básica]. Tanto que agora em maio, o município teve que aportar R$ 2,2 milhões de recursos próprios para quitar a folha de pagamento da educação. Hoje, a educação tem gerado desfalque no caixa do Município. Nós perdemos muitos alunos para cidades vizinhas. No ano passado no mês de setembro, quase três mil alunos não tinham iniciado as aulas. Aí, neste ano, muitos pais não matricularam seus filhos nas nossas escolas. Nossa maior luta vai ser garantir os dias letivos exigidos pela legislação. Além disso, são quatro meses sem pagar as empresas que prestam serviço, e a estrutura física das escolas, tanto na sede como na zona rural, também está completamente deteriorada.
Nas eleições deste ano, o senhor pretende se candidatar?
Bem antes de a Justiça determinar o nosso retorno à frente da prefeitura de Jequié, a gente vinha dialogando com o grupo. Esse grupo tem oito pré-candidatos a prefeito de Jequié. A nossa posição é que o nome do candidato venha desse grupo. Eu, de forma muita clara, sou pré-candidato. Mas nesse momento não tem muita lógica pensar em reeleição. Não é clichê nem frase solta. É algo que a gente vai deixar mais para frente.